quinta-feira, 6 de outubro de 2011

FIM DOS CASSINOS: 1946?

 
A carta acima foi escrita pelo Dr. Helvécio Antônio Horta Arantes, Delegado de Polícia que veio a Poços de Caldas para encerrar o jogo, proibido em 1946 no governo do Presidente Dutra. Nela há detalhes importantes sobre a vida da cidade e uma curiosidade revelada ao final. Acompanhe:
   
"Mamãe,
Hoje apenas consegui tranqüilidade para dar-lhes as notícias.
A minha vida tem estado fora dos horários costumeiros. Basta dizer que janto às 10 horas da noite. Por aí você pode calcular.
Nesta segunda-feira resolvi começar vida nova e estar presente nos horários de expediente da Delegacia.
Fiz paralisar o jogo praticado nos três casinos que funcionavam quando cheguei.
Tenho entretanto sofrido tremenda pressão por parte dos interessados na continuação do jogo.
As propostas que tenho recebido através de intermediários para transigir se elevam a cifras difíceis de acreditar.
Um empresário ofereceu-me 3.000 cruzeiros diários e o do Casino da Urca um automóvel que seria registrado como de minha propriedade embora aparentemente ficasse como uma doação à Delegacia.
Um intermediário, meu conhecido antigo, calculou em pelo menos 120 contos por mês as vantagens que obteria se permitisse o jogo nos 3 casinos.
Não tenho interesse entretanto nas propostas. É efêmero o proveito de tal deshonestidade.
Anteontem conversei pelo telefone com o Luis Soares da Rocha. Percebi-lhe a intenção de deixar-me aqui definitivamente.
Só desejo ficar aqui até a Semana Santa. Se até lá for realmente a intenção da Chefia deixar-me aqui, reagirei e convocaremos todos os elementos que possam intervir para o meu regresso.
Estou hospedado no Palace. Devo entretanto mudar-me pois aquele hotel está arrendado a um grupo que explora o jogo e pouco à vontade tenho me sentido naquele meio de banqueiros da jogatina.
Qualquer correspondência deverá ser enviada para a delegacia.
Como vão todos em casa? Escreva-me logo dando as notícias.
E o Taro, tem sido bem tratado pela Lina?
A todos muitas lembranças e a você o meu abraço saudoso.
10-3-52
Poços de Caldas"

Alguns pontos chamam atenção nessa correspondência. Primeiro, a data: 1952. Seis anos após o governo decretar o fim dos jogos de azar, pelo menos três cassinos estavam operando em Poços de Caldas; depois, as tentativas de manter o funcionamento a qualquer custo, rechaçadas pelo delegado, que, desconfortável até com a hospedagem no mesmo local dos "banqueiros", mudou de hotel.

Uma frase da carta também merece destaque: "É efêmero o proveito de tal deshonestidade". Um exemplo a ser seguido.

O Dr. Helvécio

"Seu nome é unanimidade na Polícia civil, pelo caráter, integridade e idealismo em defesa da instituição policial. Sua postura, mesmo quando em posicionamentos antagônicos aos de seus adversários, eram recebidas com respeito. Foi um dos grandes defensores da Guarda Civil nos momentos de turbulência, junto de José Resende. Nas décadas de 50 e 60 era a personalidade da Polícia Civil que se destacava nos grandes eventos, como a inauguração do DI, onde foi o primeiro chefe, a inauguração da Delegacia de Furtos e Roubos na Rua Pouso Alegre e de forma melancólica e triste fez o comovente discurso quando da extinção da Guarda Civil, em princípio de 70. Foi um marco de dignidade na Polícia Civil. Em sua homenagem a Câmara Municipal deu seu nome a uma Rua de Belo Horizonte e ao Plenário daquela casa legislativa, em um justo reconhecimento ao seu caráter de policial e homem público". 

 
Memória de Poços de Caldas agradece às amigas Maria Tereza e Carmen Junqueira Arantes -respectivamente viúva e filha do Dr. Helvécio- por compartilhar esse importante documento histórico.
 
Clique nas imagens do Memória de Poços de Caldas para ampliá-las.
   

3 comentários:

Carmen Lúcia Junqueira Arantes disse...

Caruso,

tristes tempos em que vivemos, do vale-tudo, onde o que impera é a falta de ética e ações em benefício próprio daqueles que são remunerados exatamente para trabalhar em prol da comunidade.

Neste cenário, a postura do meu pai, que deveria ser a postura natural de qualquer homem envolvido com a coisa pública, passa a ser uma virtude.

Ainda torço para que nossos filhos possam viver tempos melhores.

Obrigada por compartilhar dos mesmos princípios que buscamos priorizar, como forma de nortear as nossas vidas.


Um grande abraço,

Carmen Arantes

Tina disse...

PAI

- É um privilégio cantar ao mundo com todas as letras e sons, o "PAI" magnífico que voce foi;
- É um privilégio te-lo indelével em minha mente;
- Foi privilégio curtir sua honradez e honestidade;
- Valorizar sua probidade;
- Será um privilégio perpetuar aos meus frutos as virtudes de sua vida irreparável;
- Será um privilégio ter infinitas saudades suas , e continuar cada vez mais a
amá-lo.

Para sempre,

Sua filha Maria Cristina

Não poderia deixar de agradecer ao amigo Rubens Caruso pelo excelente
trabalho junto a "Memórias de Poços de Caldas".

EDUARDO JUNQUEIRA PAYNE disse...

Caruso,

é muito importante que exemplos como o do Dr. Helvécio sejam sempre lembrados.
Obrigado pela sua participação na preservação da história.

Abraço,

Eduardo

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